sábado, 25 de setembro de 2021

A liberdade do meu filho

Quando meu filho nasceu, do silêncio do útero à incandescência da luz foi um mergulho rápido, quase feliz, e nas mãos que o apararam ele deve ter sentido um gosto incógnito de liberdade. Então o trouxeram ao meu peito, cuja auréola ele soube logo encaixar à boca, e sorveu meu leite sem horas marcadas, por anos marcados, esquecido de qualquer outro gosto que lhe tenha adoçado os sentidos. Cresceu atado aos meus braços, que em cada chamado seu se apresentavam firmes e heroicos, e ele teve medo que livre deles fosse devorado pelos dragões da maldade. 

Ainda bem jovem, meu filho conheceu o desejo de ser livre, de alcançar os picos da terra, de alçar voos maiores que as asas, aventurou-se em amores sem amarras, despertou todos os pássaros que trazia no peito. Mas sempre que os pássaros tiveram fome, ele voltou pelo pão e pelo afeto. 

Quando meu filho se tornou um homem, proclamou que nenhum pão e nenhum afeto o privariam do sonho de liberdade. Deixou pátria, deixou família, exilou-se dos amigos da vida inteira, retirou-se por caminhos desconhecidos, na companhia única de seu próprio coração. Por muito tempo viveu o que quis e como quis, conquistou, desbravou, amou, desamou, foi feliz, infeliz e chegou a criar as suas próprias leis. Até o tempo em que não pode mais suportar as satisfações que devia a Deus.

Quando meu filho retornou, não foi necessário que me dissesse que finalmente compreendeu a essência da liberdade. 

 

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